sábado, 14 de fevereiro de 2009

In Memória aos dois irmãos amados!

Na simplicidade da vida, noto, que a simplicidade é simples demais e ao mesmo tempo rica demais.
Ainda ontem eu passei por lá e os detalhes eram os mesmos, o mesmo portão, a mesma calçada, a mesma fachada, a mesma casa!
Porém, os anos encarregaram-se de deteriorar tudo: a pintura mesclada com bolor, o portão mesclado com ferrugem,a calçada mesclada com buracos...A simplicidade era a mesma, porém a riqueza dela não estava mais lá.
Parei em frente ao portão e oscilei entre entrar e voltar, com o coração a bater disparadamente, entrei:
A mesma sala, os mesmos móveis, empoeirados, naturalmente! Ainda assim sentei naquele velho sofá e vi ali em forma de lembrança "um feedbach": estávamos ali brincando e rindo. Aquela sala já fora coxia...quando encenávamos tantas peças teatrais, as peças não eram baseadas em grandes obras, eram baseadas na nossa infância, na nossa experiência de mundo e as temáticas sempre sobre amor...quanto de amor foi encenado naquela mesma sala e agora ali naquela platéia sózinha, lágrimas escorreram de meus olhos. Quanto amor, amor dos três.
Sai da sala e fui ao banheiro, os mesmos azulejos, alguns descolados e caídos no chão, a pia quebrada e o espelho rachado. Aquele banheiro, a aquele banheiro, viu tantos banhos dos três, ouviu tantas músicas desafinadas cantadas pelos três e sentiu-se desesperado várias vezes com o desespero dos três ao se trancarem lá para fugir dos sermões do pai. Quando aprontavam!
Fui à cozinha, a mesma mesa grande que comportava toda família, aquele armário todo desajeitado e a pia intacta, pia boa aquela!Lembrei-me de quantos pratos já lavara ali, muitos pratos, panelas e afins, não senti saudade dessa parte. Senti saudade de ver-nos revirando as panelas em busca de algo, abrindo a geladeira mil vezes e fazendo as misturas mais esquisitas como café com farinha e pão com banana. Simples beleza!!!
Fui ao quarto dos fundos, parei na porta e enxerguei meus pais a ver tv e nós ali nos pés, a assistir e falar e falar mais do que assistir e a brincarmos na cama, a nos abraçarmos, a rirmos, a sermos tão felizes juntinhos ali, ali naquele cômodo. Lágrimas escorreram novamente de meus olhos e fui imediatamente para o quarto que era meu!!! Os móveis estavam relativamente novos, tudo estava no lugarzinho em que deixei, as almofadas combinando com as cortinas, tapetes, colcha, tudo em tom de rosa, branco e lilás, lindo quarto. Me vi dançando descalça com o som alto e a porta fechada, vi minhas amigas abrindo meu guarda roupa e procurando algo para vestir antes da balada, vi em momentos tão especiais os três assistindo tv ali no tapete, via muitos momentos de amor e algumas briguinhas também, pois, foram várias na infância, mas, na adolescência, vi ali naquele mesmo quarto momentos de muita cumplicidade entre os três, momentos de muita amizade, afeto, amor!
Fui ao quarto deles e me vi entrando e encontrando sempre um deitado com uma moça e a lembrar as frases de constrangimento tanto delas como minha e o sorriso de orgulho deles estampado em seus lindos rostos. Me vi, chamando eles tantas vezes, arrumando suas roupas, calçados, limpando aquele quarto e exigindo que existisse a ordem, mas, tendo certeza que a bagunça perduraria ainda por muito e eu teria que limpar e muito e falar e muito e ri...ri sozinha. Simples beleza...pura simplicidade...Simples e rica!
Saí para o quintal e vi a gente lá em cima, nas mangueiras e limoeiros e encontrei as nossas cabaninhas e as nossas panelinhas com comida de verdade.
Sentei no quintal e parece que foi ontem. Ontem que éramos três irmãos unidos, felizes, três irmãos amados, e três amigos para toda uma vida. Mas, não foi ontem! Muitas, muitas coisas aconteceram e eis me aqui sentada nesse quintal sozinha apenas relembrando tudo que vivemos e pensando que agora, agora é que seria legal, ainda mais legal, sermos cúmplices de tudo, sermos amigos em tudo e nos curtimos e curtirmos a vida muito e a simplicidade e a pureza dessa união.
Parece que foi ontem, mas, o hoje me faz chorar ao lembrar que destinos foram opostos e que tragédias aconteceram e que a separação foi fatal.
O que fica disso tudo é a certeza que a simplicidade da infância, dos momentos que juntos passamos foi a mais bela literatura de minha vida, com certeza a obra mais digna de ser lida, relida e contada. Uma obra clássica para mim!
O "romantismo", romantismo esse que passou por todas as gerações, mas, tirou de mim, a beleza de duas almas, quando essas se aprofundaram na "2ª geração", aquela que apresentou o "mal do século", e marcou a vida dessas almas o pessimismo, o negativismo e os levou daqui, e os levou de mim.
Chorei, um choro, nostálgico! Enxuguei minhas lágrimas e o novo proprietário da casa chegara, apresentei a ele as dependências e com um aperto entreguei as chaves. Ali, ali, naquelas chaves fica a história de uma infância, naqueles cômodos segredos de uma família e a deterioração demonstra a passagem do romantismo para o realismo e com essas marcas de estrago na casa também fica o estrago real nessa história. Estrago que demonstra que agora não somos três, somos apenas dois, o "mal do século", a droga levara um dos três e afastara também os dois.
Entrego as chaves e a família entra na casa, são: marido, mulher duas filhas e um filho, mudara apenas o sexo, na família original eram dois filhos e uma filha. Em meio ao aperto de deixar definitivamente a casa, fica a esperança que para esses três a era seja de "romantismo" sempre, mas que diferentemente, priorizem em todas as fases da vida uma releitura apenas da "1ª geração romântica" e que dela sigam fielmente a idealização do amor, apenas do amor, para que quando chegue o "realismo" o deles seja menos cruel e mais dócil.
Saio de cena, com a certeza de que foi bom demais ser irmã de duas pessoas tão especiais e com a tristeza de saber que tão cedo houve fim dessa história que poderia ser reescrita e tornado-se um grande "best seller".
Continuarei aqui me lembrando de que conhecer vocês, conviver com vocês, faz me entender que a "Simplicidade é muito rica mesmo", e que sem vocês dois, não teria vivenciado a mais bela obra e a mais "PURA" literatura de todas.
Amo vocês...sempre!
Ainda ontem, passei por lá e tudo, tudo estava tão diferente, outra casa, outra história!

2 comentários:

sueli aduan disse...

...outra casa, outra história!

Marinês, triste sim, mas vc conseguiu torná-la bela,uma história pra lá de humana, me emocionei. bjs

Marinês disse...

Bjus Sú...
Uma história para lá de verídica!!!